Enchentes ainda têm solução em Pinheiros
Até os anos 1930, a paisagem de Pinheiros remetia a de típicas cidades do interior. Córregos “cortavam” os bairros da região, que ainda mantinham algumas características das áreas rurais, sem grandes edificações ou asfalto predominando. Porém, a partir da década de 1960, o cenário da região começou a mudar com a construção dos primeiros prédios residenciais e a substituição dos paralelepípedos das vias públicas pela pavimentação atual. Os córregos também tiveram de se adaptar aos novos tempos, entre eles, o Verde, que percorre os bairros Jardim das Bandeiras, Vila Madalena, Pinheiros e Jardim Paulistano.
O ribeirão, com nascente próxima das ruas Heitor Penteado e Beatriz Galvão, foi canalizado há cerca de 40 anos e hoje faz os paulistanos lembrarem que ele ainda existe nas épocas de fortes chuvas, quando suas águas transbordam das bocas de lobo e causam enchentes como as das ruas Girassol, Fidalga, Fradique Coutinho, Mateus Grou, Artur de Azevedo, Joaquim Antunes e Cristiano Viana.
No entanto, segundo o arquiteto e urbanista Nabil Bonduki, as inundações na região são agravadas também pelo processo de verticalização da cidade, intensificado nas últimas décadas. “Os córregos são áreas de fundo de vale, que quanto mais impermeabilizadas estiverem, fazem o solo precisar de maior vasão. Quando isso não acontece, surgem as enchentes”.
A região de Pinheiros é uma das mais valorizadas da Capital pelo mercado imobiliário, o que faz as incorporadoras projetarem edifícios cada vez mais altos. “Por consequência, estes empreendimentos têm garagens maiores, que impermeabilizam o solo, mesmo quando existem áreas verdes no térreo”, afirma Bonduki. “O atual Plano Diretor melhorou um pouco a situação, pois fez com que a taxa de permeabilidade de um terreno passasse de 10% para 15%. Porém, este índice ainda é insuficiente, pois como a região tem declividade acentuada, as águas correm rapidamente para as áreas baixas, os fundos de vale”, completa o urbanista.
Alguns moradores e comerciantes das ruas Fradique Coutinho, Artur de Azevedo e Mateus Grou, situadas em áreas baixas, afirmam que as enchentes passaram a ser mais frequentes após as obras da futura Estação Fradique Coutinho do Metrô serem iniciadas em 2005. No entanto, o Consórcio Via Amarela, responsável pelas obras da Linha 4 - Amarela, informou à Gazeta de Pinheiros - Grupo 1 de Jornais que não tem nenhuma relação com as enchentes e inundações relatadas pela população.
Soluções polêmicas
Uma das saídas para combater as enchentes na região é a construção de um piscinão nas praças General Oliveira Álvares e Jaques Bellange, no bairro do Jardim das Bandeiras. O reservatório, orçado em R$ 14,8 milhões, começou a ser desenvolvido em 2003 pela Secretaria de Infraestrutura Urbana (Siurb) na gestão da ex-prefeita Marta Suplicy e faz parte do projeto Bacia do Córrego Verde, idealizado para reduzir as enchentes na região.
Porém, a execução do piscinão, licitado em 2008, está impedida, pois a Associação Amigos do Jardim das Bandeiras (AAJB) contatou a Promotoria do Meio Ambiente e conseguiu a paralisação do projeto na Justiça. O argumento utilizado pela entidade foi que a proposta do piscinão não inclui estudos suficientes que demonstrem os impactos ambientais que pode provocar na região, como, por exemplo, a remoção de árvores raras das duas praças.
Segundo o presidente da AAJB, o arquiteto e urbanista Caio Machado, a melhor alternativa para se reduzir os efeitos dos alagamentos em Pinheiros seria a reativação de galerias desativadas, reforma das já existentes e abertura de novas bocas de lobo. “Encomendamos um estudo técnico para provar à Siurb que há outras saídas para se resolver a situação, menos dispendiosas e mais práticas”, disse em entrevista à Gazeta de Pinheiros.
Caio Machado tem o apoio da presidente da Rede Nossa São Paulo, Lucila Lacreta, também moradora do Jardim das Bandeiras. “Hoje temos sob o canteiro das ruas Girassol, Belmiro Braga e Horácio Lane um ‘salão’ anexo a duas galerias desativadas, que poderiam captar as águas das chuvas e evitar alagamentos naquela área”, afirma ela. “No entanto, como essas estruturas são antigas, caso não venham a ser utilizadas, podem até desmoronar de maneira semelhante à galeria que passa sob a Rua Cipriano Juca, quando um buraco se abriu e engoliu um carro no último dia 11”, adverte.
O projeto Bacia do Córrego Verde ainda inclui a implantação de uma nova galeria ao longo das ruas Joaquim Antunes e Artur Azevedo, conectada ao trecho do Córrego Verde situado sob a Rua Mateus Grou. A iniciativa engloba também um piscinão a ser construído junto ao sacolão do Viaduto Sumaré, na Rua João Moura, que deverá abater as cheias no cruzamento da Rua Fradique Coutinho.
Alternativas ecológicas
Outra opção para reduzir os impactos das enchentes em Pinheiros é a implantação de um parque linear ao longo do Córrego Verde, encomendado recentemente pela Secretaria do Verde e do Meio Ambiente. O projeto, desenvolvido pelo escritório de arquitetura Davis Brody Aedas, propõe a reconstituição da drenagem ecológica e natural do trecho do canal entre a Rua Heitor Penteado e o beco da Rua Belmiro Braga.
Caso o parque linear seja realizado como proposto, o Córrego Verde voltaria a correr ao ar livre e a se integrar ao cotidiano da região, pois teria áreas de lazer ao longo do seu traçado. O projeto será financiado pelo Metrô, através de um Termo de Compromisso Ambiental, como compensação pelas obras da Linha 4 - Amarela. A Secretaria do Verde e do Meio Ambiente estima que a versão final do projeto esteja pronta até o primeiro semestre de 2011, para depois licitar a obra.
A Subprefeitura de Pinheiros também desenvolve um planejamento próprio para reduzir a ocorrência dos alagamentos. O trabalho, iniciado em 2008, consiste numa análise sobre a capacidade de captação e drenagem das águas nas ruas da região. O estudo foi licitado em junho de 2010 e aguarda liberação de recursos para contratação, que deve ocorrer nos primeiros meses de 2011. A subprefeitura ainda esclarece que as bocas de lobo das ruas Fradique Coutinho, Mateus Grou e Joaquim Antunes são limpas constantemente.
Já Nabil Bonduki sugere uma série de pequenas intervenções que visam não só a solução dos alagamentos já existentes, mais a prevenção de outros novos. “Precisamos rever o processo de ocupação do solo, implantar tanques de retenção das águas da chuva em cada novo empreendimento, estimular as casas antigas a retirar a pavimentação dos quintais, reduzir o leito carroçável das ruas e ampliar as calçadas verdes”. Ainda segundo ele, grandes obras pontuais, como os piscinões, não são a única saída para o problema. “A mudança de consciência e da cultura urbana do poder público e da população é fundamental, assim como a mudança quanto à visão de desenvolvimento da cidade”.
Diego Gouvêa
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